O Tempo

Sunday, October 02, 2005

Viver de artesanato é possível

Setor movimenta R$ 28 bi por ano no Brasil, o correspondente a aproximadamente 2,8% do Produto Interno Bruto (PIB)

Júnia Leticia


Além de um papel importante para divulgação da cultura, o artesanato tem sido para muitos brasileiros uma alternativa de renda. De acordo com levantamento realizado pela Secretaria do Desenvolvimento da Produção, órgão do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), o setor movimenta cerca de R$ 28 bilhões por ano no Brasil, o correspondente a cerca de 2,8% do produto interno bruto (PIB) – uma participação que supera a de indústrias tradicionais, como do vestuário (2,7%), de bebidas (1%), farmacêutica (1%) e mobiliária (1%). São cerca de 8,5 milhões de artesãos, com rendimento médio de dois a três salários mínimos mensais.

A artesã Luciana Souza é um exemplo de quem vive desse ofício. Há aproximadamente 20 anos ela e o marido confeccionam pufs e peças em biscuit – técnica que utiliza uma massa caseira, à base de amido de milho e cola, para confeccionar enfeites em geral –, que começaram a ser comercializados há 18 anos na antiga Feira Hippie, na Praça da Liberdade, hoje Feira de Arte, Artesanato e Produtores de Variedades da Avenida Afonso Pena, em Belo Horizonte. Segundo ela, que criou quatro filhos com o artesanato, dedicando-se com carinho e seriedade ao trabalho, dá para se viver. “Eu, meu marido e meus filhos temos o artesanato como única renda”, conta.

Para se trabalhar no ramo, é preciso contar com o imprevisível, já que não há como se precisar uma renda fixa. “Há domingos em que há um grande volume de vendas, em outros, não”, informa Luciana Souza. Ao se expor na feira, o artesão também entra em contato com outras culturas, uma vez que o local é visitado por pessoas de várias partes do país e do mundo. “Recebo encomendas de vários Estados, como Rio de Janeiro, Bahia e Brasília”, diz a artesã.

Lindacyr Souza Silva é mais uma artesã que vive de seu trabalho. Há 20 anos, ela confecciona sachês e velas perfumadas de parafina. “Exponho meus trabalhos da Feira da Afonso Pena. Com eles, criei meus filhos. Desenvolvi mais de 50 modelos de sachês e velas perfumadas, que vendo para clientes de todo o Brasil”, conta.

O couro é a principal matéria-prima para que Israel Ferreira Coura executar seus cintos, também expostos na Feira da Afonso Pena. Ex-agricultor, Coura encontrou no artesanato uma nova fonte de renda. “Há 17 anos mantenho minha esposa e quatro filhos com o dinheiro que obtenho do artesanato”, diz Coura. Para iniciar-se no novo empreendimento, o artesão contou com a ajuda de amigos, que lhe ensinaram o ofício. Uma das dificuldades encontradas por ele para trabalhar na área é lidar com a inadimplência. “Tenho alguns problemas com cheque sem fundos. Fora isso, o artesanato, assim como o comércio em geral, depende da situação econômica do país”, esclarece.

A fim de apoiar o artesão mineiro e combater a venda de barracas da Feira da Afonso Pena para aluguel, há 13 anos foi fundada em Belo Horizonte a Associação dos Artesãos e Produtores de Variedades do Estado de Minas Gerais (AAPV-MG). De acordo com o seu presidente, Marcos Landa, atualmente a AAPV-MG possui cerca de 750 associados de Belo Horizonte e região.

Entre as atribuições da AAPV-MG estão a qualificação dos artesãos e dos produtores de variedades – aqueles que confeccionam peças de cama, mesa e banho, além de vestuário – e a promoção de cursos de cooperativismo e associativismo. “Nosso objetivo é que esses trabalhadores saiam da informalidade. Também lutamos para abrir novos mercados de venda para a produção dos artesãos”, enfatiza Landa.

Importante fonte de renda individual e familiar, é com o artesanato que, segundo o presidente da AAPV-MG, aproximadamente 10 mil pessoas no Estado sobrevivem. “E cada artesão gera, direta e indiretamente, uma média de três empregos”, completa.

Feira da Afonso Pena tem 2.500 expositores

Grande parte dos artesãos da capital mineira e da Grande BH encontram na Feira de Arte, Artesanato e Produtores de Variedades da avenida Afonso Pena a oportunidade de divulgar seus trabalhos. Surgida em 1969, na Praça da Liberdade, a feira era conhecida como Hippie e contava com aproximadamente 465 expositores.

Em 1973, a feira foi oficializada, passando a ser regulamentada pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH). Devido ao grande número de visitantes e à demanda de expositores, em 1991 a ela foi transferida para a avenida Afonso Pena.
Segundo a assessoria de comunicação da PBH, hoje 2.500 expositores difundem seus trabalhos na Feira da Afonso Pena, como é popularmente conhecida. Todos os domingos, cerca de 60 mil pessoas visitam o local.

Para defender os interesses dos artesãos que expunham na antiga Feira Hippie, hoje Feira da Afonso Pena, há mais de 30 anos foi fundada a Associação de Artes e Artes Artesanais. “A entidade surgiu junto com a feira, por iniciativa de artesãos que na época expunham seus trabalhos em uma feira na Praça Raul Soares, em Belo Horizonte”, informa o presidente honorário da associação, Orlins Pellegrine Freitas.

Como a Feira da Afonso Pena também é visitada por turistas de outros países, uma das metas da associação é propagar a arte nacional. “Queremos levar a cultura de nosso país para o mundo”, ressalta Freitas. Recentemente, no início de agosto, os artesãos foram convidados para participar da Feira Internacional de Astúria, na Espanha. “Além de produtos como o café e a cachaça, Minas também é reconhecida internacionalmente pelo artesanato”, comemora.

"Mãos de Minas" envolve 10 mil artesãos

Um dos projetos responsáveis por apoiar o artesão mineiro é a Central Mãos de Minas. Criada em 1983, a Mãos de Minas é hoje uma organização não-governamental formada por associações e cooperativas do Estado de Minas Gerais, tendo sua sede na cidade de Belo Horizonte. Participam direta e indiretamente do projeto cerca de 10 mil artesãos mineiros.

Entre as atividades da Mãos de Minas estão a legalização de vendas com a emissão de nota fiscal para acobertar as vendas de seus associados, a comercialização de produtos artesanais – principalmente no interior do Estado –, aquisição de matéria-prima para o artesão diretamente do fabricante, legalização dos processos de exportação dos associados, apoio ao fortalecimento de cooperativas e busca de soluções legais para o segmento. “É um projeto que trabalha com o artesão empresário a fim de gerar renda e melhorar sua qualidade de vida, trazendo-o para a formalidade”, enfatiza a consultora da Mãos de Minas, Tânia Machado.

Além da divulgação da cultura nacional, tendo em vista seu trabalho no projeto, Tânia Machado constata a viabilidade do artesanato, que garante a sobrevivência de muitas pessoas. “O setor tem representado uma importe fonte de renda para milhares de brasileiros”, confirma a consultora.

Outra fonte de apoio para o artesão mineiro é a Superintendência de Artesanato. Órgão ligado à Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico (Sede/MG), a superintendência iniciou suas atividades em abril de 2003. Segundo a assessoria de comunicação da Sede/MG, Minas Gerais é o único Estado que tem uma superintendência de artesanato incorporada à sua administração pública.

A Superintendência de Artesanato tem por finalidade implantar, executar e coordenar a política estadual do artesanato mineiro, que é articular e implementar ações visando ao desenvolvimento setorial e regional do artesanato. Propor leis e normas para o setor e incentivar o estabelecimento de organizações de artesãos são algumas das outras atribuições da Superintendência.

1 Comments:

  • Adorei teu blog. Informativo e dinâmico. Pena que não parece atualizado nos posts. Sucesso.

    By Blogger Walkíria Diniz, at 7:23 PM  

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